quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

O apelo pelo beijo


O ano mal começou e as famílias brasileiras já se deparam com o primeiro grande dilema de 2014: será que finalmente vai rolar beijo gay na tela da TV? Claro, o finalmente fica por minha conta e a preocupação/aflição/indignação de que seja exibido qualquer tipo de afeto entre pessoas do mesmo sexo no horário nobre da televisão cabe a alguns milhares (ou milhões, vai saber) de telespectadores dos famosos folhetins da Rede Globo. 

Pra quem não acompanha e não sabe do que se trata, a emissora exibe desde maio de 2013 a telenovela Amor à Vida, do autor Walcyr Carrasco. Recentemente, após deixar cair por terra todas as maldades do vilão-gay-jogador-de-bebês-no-lixo Félix (Mateus Solano), a trama apostou em um processo de reabilitação moral da personagem, que além de fazê-lo reconhecer e pedir perdão pelos seus crimes, consistiu numa sincera aproximação do ex-vilão com Niko (Thiago Fragoso), mais um personagem gay da história.

A relação de Niko (o rapaz fofo e de família) com Félix (o vilão arrependido) surgiu como uma amizade despretensiosa e ganhou contornos mais sensíveis. Primeiro, para mostrar que o malvado também é capaz de bons gestos; segundo, para dar asas a um “romance” bem mais instigante que o vivido pelo casal protagonista da novela, Paloma (Paola Oliveira) e Bruno (Malvino Salvador). 

Ainda que nada de mais íntimo tenha acontecido entre os dois, a expectativa – para o bem ou para o mal – é a do beijo, já que não é a primeira vez que um casal gay dá o ar da graça na teledramaturgia brasileira. No entanto, podada pelo preconceituoso conservadorismo e tantas outras questões sociais, a cena do beijo gay é descartada em todas as situações. Exceto quando o SBT exibiu o beijo entre Marcela e Mariana na telenovela Amor e Revolução – nada que tenha apresentado muita repercussão.


O assunto, é claro, divide opiniões e estremece a base conservadora daqueles que acreditam na família em sua formação heteronormativa: homem + mulher. Ainda assim, há uma grande comoção e torcida pelo beijo. Mesmo que não representem uma totalidade, perceber que existe uma boa parcela de pessoas cruzando os dedos pela felicidade do casal, mobilizando-se nas redes sociais, por exemplo, reforça a esperança e a fé de que o amor seja entendido em sua essência, independente de qualquer fator e, principalmente, condição sexual. 

Niko e Félix não são personagens da chamada “ditadura gay” alarmada e temida por muitos. São personagens do afeto e do carinho tão intrínsecos ao homem. Sem adentrar por questões militantes, políticas ou religiosas, é interessante que se observe nesse cenário de expectativas por um único beijo, dentre tantos que já marcaram a história da televisão brasileira, a luta pela democratização do amor e da sua livre exposição, sem o velho medo reticente que ainda paira sobre nossas cabeças.

Junior com Zeca e Clara com Rafaela figuram entre os casais gays com grande expectativa de beijo na telenovela brasileira.

Se a vida imita a arte ou vice e versa, Niko e Félix representam o que há de mais precioso numa relação: o cuidado, o querer bem, o porto seguro e a certeza do velho ditado que sugere que “os opostos se atraem”. A ficção pode não espelhar a realidade em sua plenitude, mas aponta, ainda que timidamente, caminhos para um abrir de olhos e de corações ligados a questões como essa, em que o apelo é pelo fortalecimento do amor e suas manifestações. 

Segundo informações extra-oficiais, a Rede Globo já deu carta branca ao autor Walcyr Carrasco e Niko e Félix irão se casar ao final da trama. Será que até lá poderemos ouvir um “pode beijar o noivo” e assistir a um beijo sem cortes e com fortes aplausos? Vamos cruzar os dedos e aguardar que essa novela cheia de reviravoltas faça, finalmente, jus a seu nome.

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