domingo, 13 de abril de 2014

Tinder: a vitrine do amor


Podem até dizer o contrário, mas na particularidade de cada um, um dos maiores desejos do homem – e digo o homem enquanto espécie – é encontrar alguém pra dividir a vida e nunca mais largar, feito pinguim ou cavalo-marinho. Nenhuma pesquisa baseia meu pensamento, também tenho a convicção de que ele não se aplica a todas as pessoas, mas não é de hoje que partir em busca de uma companhia afetiva para um relacionamento sério e duradouro se tornou algo de suma importância na vida das pessoas.

Se antes cabia à família estabelecer os encaixes amorosos e “arranjar” os casamentos dos seus jovens, há um bom tempo eles aprenderam a “botar sua parada para jogo” e ir atrás, eles mesmos, da sua metade da laranja das formas mais diversas. No século passado, e ainda nesse, vimos programas de TV no papel de cupido, na esperança de saber dos seus alvos em questão se era namoro ou amizade, se rola ou enrola. Pode ser que a exposição em rede nacional soe desesperadora, mas a perspectiva de uma vida solitária grita desesperadamente no íntimo de muita gente. 

Agora, em tempos de redes sociais, smartphones com tecnologia 3G ao alcance das mãos e em qualquer lugar – a depender da boa vontade das operadoras de telefonia, claro – e aplicativos diversos de interação interpessoal, a forma de procurar e demonstrar interesse pelo par perfeito mudou: seja por um like naquela foto publicada meses atrás, uma cutucada com terceiras e quartas intenções, um deslizar de dedo e uma nova combinação formada no famoso Tinder. Em meio a tantas inovações não só o modo como procuramos, mas também o modo como enxergamos o outro mudou. O Tinder, por sinal, é exemplo de como – por puro “capricho” – transformamos nossas “possíveis” almas gêmeas em mercadorias, e agimos como numa situação de compra e venda, trocas e encomendas vez ou outra com algum retorno.



O aplicativo é um grande catálogo que lista, através de algum mecanismo de busca, os solteiros de plantão da redondeza. O perfil de cada um é composto de fotos e algumas informações pessoais, restando ao comprador usuário dizer se gosta ou não do perfil que lhe foi apresentado. E assim o inverso também acontece. Uma vez cadastrado, a sua imagem de moço(a) para namorar estará disponível para avaliação de anônimos de toda a parte. Se a mensagem “uma nova combinação foi feita” surgir, é sinal de que ambos se curtiram e então é hora de partir para o abraço. 

É o prévio anonimato que garante a diversão da escolha, assim como num dia no shopping olhando manequins de loja em loja. O que vende mesmo é aquela foto tirada no melhor ângulo, ou naquela festa badalada, ou naquela praia, ou ainda aquela com sua melhor roupa. O que vende é o perfil sem a cafonice das frases copiadas do velho Orkut do tipo “quem se define se limita”; sem o suposto trecho de Caio Fernando Abreu ou de Clarice Lispector. Vende aquilo que você quer mostrar e que o outro quer ver. É a lei da oferta e da procura em sua mais pura essência, o “eu tenho pra vender, quem quer comprar” da vida digital. 

Quem dera essa relação “comercial” se restringisse apenas ao aplicativo em questão e seus semelhantes. Também nas relações orgânicas do cotidiano somos guiados, primeiramente, pelo que os olhos veem. Somos manequins ambulantes num reflexo do que esperam de nós, de como nos vestimos, agimos e pensamos. As relações são as mesmas, ainda que inconscientes. Porém, os mecanismos utilizados, sejam eles naturais ou não, é que irão ditar a maneira como elas irão se desenvolver.

Para quem transita entre os dois mundos, e do virtual para o real, o problema é que ainda não inventaram um coração de pixels e batimentos feito ringtone ou mp3. Não sou contra o uso de aplicativos, chats ou qualquer outro artifício tecnológico para encontrar alguém, mas é bom estar ciente das conseqüências ao oferecer o coração como moeda de troca. É bom ficar esperto no seguinte: o amor à primeira vista no mundo digital, sempre pede uma segunda olhadela na vida real.

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