segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Entre o prato frio e a outra face


Das páginas dos livros mais esquecidos na estante às telas dos tablets ou mesmo dançando nas notas graves das canções, não há quem não tenha notado que há uma tendência especialmente moderna à supervalorização e exploração fria de um dos sentimentos humanos mais primitivos: a sede quase incontrolável pela vingança.

A vingança é um sentimento intrínseco à natureza humana, muitas vezes cultivada sob olhares “amigos”, sorrisos falsos e beijinhos de afeto que enganam bem as “pobres vítimas”. Quando Alexandre Dumas revelou ao mundo o mapa para Monte Cristo, pouco deveria saber sobre os futuros protagonistas do século XXI que fariam de seu romance uma filosofia de vida.

Emily Thorne é o exemplo mais concreto e forte do espírito de Monte Cristo entre as produções mais recentes, mas está longe de estar sozinha no rol daquelas que fizeram da sede de vingança o fundamento de seus atos. Engana-se quem pensa que foi a ABC pioneira em tratar da questão. Um ano antes do sucesso “Revenge”, a CW já havia apresentado a determinada e revolucionária Nikita em sua empreitada contra a Death Row, em 2011.

O campo da música também empresta terreno aos protagonistas de histórias no melhor estilo “justiça com as próprias mãos”. Os clipes “Paparazzi” e “Bad Romance”, de Lady Gaga, trouxeram, com suas batidas pop, histórias de homens que brincaram, de vários modos, com a garota errada. O som caribenho que Rihanna invocou com a balada homicida e arrogante “Man Down” conseguiu atingir tão bem quanta a bala mirada naquela estação.


As produções brasileiras não ficam de fora da lista revanchistas, afinal, se no exterior Almodóvar traz para as telonas o Dr. Richard Ledgard (A Pele Que Habito, 2011), o Brasil tem a Nina, de “Avenida Brasil”. A vingança da antes pequenina Rita contra a ex-madrasta Carminha repercutiu no cenário brasileiro, tomando conta de todos os cantos do país, da mais estreita viela às hashtags do Twitter. O show de atuação protagonizado por Débora Falabella e Adriana Esteves arrancou suspiros, gargalhas e tirou o ar de muitos no horário das 21h, na TV Globo.


A vingança, contudo, não surge sozinha. Na maioria das vezes que aparece nas telas da TV ou nos livros, ela vem acompanhada de boas doses de paixão que dificultam ou impedem o real “acerto de contas” da história. Klaus que o diga. O híbrido original de “The Vampire Diaries” deve ter perdido as contas das vezes que engoliu o seu orgulho e deixou cessar a fúria do espírito vingativo apenas para agradar sua Caroline. A combinação de amor e pedidos de perdão também marcou a literatura brasileira quando Aurélia deixou adormecer a Senhora que havia nela e se aconchegou donzela nos braços de Seixas.

Se o tema está ficando velho, (o que, particularmente, duvido muito que aconteça algum dia) a NBC não parece se importar com isso. Uma nova história para o “Conde dos Vampiros” estreou na sexta, 25 de outubro, no canal. A série “Drácula” se passa no século XIX e vai tratar da vingança do mais famoso dos vampiros contra os assassinos de sua esposa.


Enquanto as páginas dos livros se encharcam com sangue e lágrimas, as vozes cantam embargadas os diferentes timbres do choro e da raiva e Drácula não começa a usar seus caninos para destilar seu doce veneno nos pescoços inimigos, ainda podemos nos servir, entre gargalhadas e frios goles, da vingança literária e artística que o mundo nos oferece, ao tempo em que o som vibrante do My Chemical Romance toma conta do ar com seu “Three Cheers for Sweet Revenge”.

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