quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Quem tem medo das fadas?


Os contos de fadas povoam a imaginação das crianças, e também dos adultos, desde os tempos medievais. A beleza e a magia deles foram transferidas para as telas de cinema pela Disney e, desde então, ficaram ainda mais marcadas e firmes no imaginário popular com músicas e vozes doces de princesas e fadas. Contudo, as lindas canções da Disney em nada lembram as histórias regadas por sangue, discórdia, inveja, violência e mutilações que formavam sombrios contos de terror e eram contados às crianças dos séculos anteriores.

Essas histórias infantis começaram a se popularizar na Europa, na Idade Média, e faziam parte da tradição oral, sendo contadas de pais para filhos por gerações. A mortalidade infantil e a fome eram inspiração para os contos e, ao contrário do que a Disney nos conta, eles não eram nada felizes e a principal intenção deles era ensinar lições de moral às crianças.


A Bela Adormecida, que conhecemos por Aurora, era, inicialmente, chamada de Tália e foi estuprada por um rei casado enquanto ainda estava sob efeito do sono encantado. Os gêmeos nascidos desse estupro, em busca do leite materno, acabam chupando o dedo da mãe e tirando de lá a farpa que mantinha a mãe adormecida. Na versão de Charles Perrault, há ainda um problema com a sogra de Tália. A rainha é uma ogra que quer devorar os próprios netos (e até mesmo a nora), mas acaba caindo na própria armadilha, que salva toda a família no final da história.

Na história de 1820 dos Irmãos Grimm, a grande vilã da história da Branca de Neve é a mãe dela, que manda o caçador matar a princesa e levar o fígado e um pulmão da garota como provas da morte. Quando o príncipe vem salvar Branca, não existe beijo de amor. Um pequeno acidente com o caixão da princesa (que o príncipe, por alguma razão, queria levar para o castelo) faz com que ela regurgite o pedaço de maçã que havia ficado entalado em sua garganta e “volte à vida”. Na comemoração do casamento, a rainha má é obrigada a dançar até a morte calçada com sapatos de ferro em brasa.  

No rol das princesas vingativas, Cinderela tem seu lugar assegurado. No conto A Gata Borralheira, do italiano Giambattista Basile, a moça fecha um baú na cabeça da primeira madrasta e a mata para que o pai pudesse se casar com uma empregada da casa. É essa empregada que se transforma, posteriormente, na madrasta má. Na história dos Irmãos Grimm, as irmãs adotivas de Cinderela mutilam os próprios pés, cortando calcanhares e dedos, para que possam calçar o sapatinho de vidro. As farsantes são desmascaradas por pássaros (amiguinhos de Cinderela) que também lhes furam os olhos e os da madrasta, levando-as à morte.


A garotinha da capa vermelha nunca esteve na Disney, mas a história bonitinha da menina salva pelo caçador é tão meiga e heróica que não pudemos deixar de mostrar ao mundo como a inocência dela foi forjada ao longo dos anos. Na França, o Lobo Mau serve a carne e o sangue da avó para Chapeuzinho Vermelho, como se fosse comida e vinho. Depois, o vilão diz à garotinha que ela tire as roupas e jogue no fogo e para que se deite com ele. É quando se deita que a menina começa a perceber os “olhos grandes”, o corpo peludo e “boca grande”, mas de nada adianta pois ela acaba virando comida (sim, há abertura para o dúbio sentido do termo aqui) do Lobo, eternizando a mensagem: “crianças não devem falar com estranhos para não virar comida de lobo”. 

O conto da Pequena Sereia não veio da tradição oral, mas sim da genuinidade da imaginação do dinamarquês Hans Christian Andersen, em 1837, que não poupou esforços ao criar uma história cruel, com uma protagonista que eu definiria como a mais infeliz de todas as heroínas infantis dos estúdios de Walt Disney.

Após se transformar em humana, a sereia (o nome Ariel é criação da Disney) não consegue conquistar o príncipe, pois este já era apaixonado por outra mulher, com quem se casaria em pouco tempo. Preocupadas com o destino da irmã que estava em terra firme, as cinco irmãs da sereia dão seus cabelos como pagamento à Bruxa do Mar para ganharem uma faca. Segundo a Bruxa, a sereia precisava matar o príncipe na noite de suas núpcias, do contrário, ela quem morreria. Incapaz de matar o amado e amargurada com seu destino, a jovem se joga de um abismo e é transformada num espírito do ar.

Seja nos filmes da Disney, nas inúmeras adaptações que hoje temos das antigas histórias ou mesmo na leitura dos contos de Grimm, Perrault, Andersen e tantos outros (e aqui já sou um tanto suspeito para falar, pois sou irremediavelmente apaixonado por contos de fadas), não há como negar que os contos de fadas continuarão encantando crianças e adultos por muito tempo.

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